Buenos Aires, 30 de novembro de 2021 a 9 de janeiro de 2022
CAPÍTULO 1
Isso não é um guia de viagem, apesar de conter dicas. Esse texto não é indicado pra quem prefere assistir ao filme a ler o livro. É sobretudo, mais uma egotrip minha.
Estávamos eu e o resto da humanidade da era pandêmica, frustradíssimos por termos que, forçadamente (pelo menos aqueles que tem algum traço de responsabilidade coletiva/empatia/acredita que a terra é redonda) termos limado a palavra viagem das nossas vidas. Faz um bom tempo que a minha forma de comemorar mais um ano de existência nesse planetinha é viajar. Tenho a sorte de comemorar anos em abril. É baixa temporada e geralmente um clima mundialmente agradável para as minhas preferências. Estou guardando toda a minha cota de calor para sentir na minha hospedagem pós morte.
Antes que mais uma letrinha grega – ômicron – (grego nunca teve fama de ser uma escrita fácil) atravessasse o nosso caminho, com bracinhos vacinados, registrados, postados e entoados #vivaosus resolvemos que era hora de voltar a praticar aquele verbo guardado: viajar.
Optamos por não afastar muito do ninho por questões lógicas e logísticas. O primeiro voo de um filhote, acredito eu que não deve ser muito longo. Destino conhecido, possível na época que não só a pandemia mais o câmbio nos força a brincar de estátua. E tem o espanhol, né bixo? Aqui em casa, fazemos reverência pra Shakira e embalamos o sextou com reggaeton. Passagem compradas, euforia garantida por aqui. Tem uma tradição em casa que toda vez que tô feliz demais, tipo para um caralho mesmo, eu faço uma dancinha ridícula. Antes era realmente uma reação espontânea, agora virou traço de personalidade.
Dancinha feita, cabeça oficina do diabo. O meu demônio particular responde pelo nome de “criatividade”. Ele não dá sossego, cria enredo, direção, fotografia e trilha sonora. É luta perdida tentar ignorar: solte suas feras!
Começou quando resolvemos fazer um novo cartão de crédito, nesses bancos modernos tipo NÓ, NU, todo mundo pelado com a mão no bolso…. podia escolher o nome que viria gravado no cartão e também a cor. Não deu outra, meu filme já tinha tílulo: Scarlet Trip.
Aqui na nossa casa inteligente, essas coisas que Lechuga (marido, também recém-batizado) coloca para atrapalhar a minha vida, tipo Google, Alexa (biscate) me conhecem pela alcunha de Scarlet Moon de Chevalier. Minha escolha pelo pseudônimo se deve ao fato de que nunca dei intimidade pra essas “coisas inteligentes” e sempre achei esse o nome mais sonoro que alguém já teve. Cantado por Caetano Veloso então, chega a soar como covardia o fato de todo mundo não poder se chamar assim.
Cartão feito: rosa-choque Scarlet Moon – não cabia o nome inteiro, coisa que nunca foi novidade pra quem carrega cinco – cadeia associativa do enredo entra em ação. Lembrei de uma viagem que fiz para Nova York na qual eu decidi que usaria tudo o que eu tivesse vontade. Usei rosas roxas na ópera, paetê no breakfast. Usei meia calça imitando cinta-liga para o terror da sertania onde morava. E aí aprendi que esse exercício que passei a fazer em viagens, aos poucos podia trazer pra minha vida. Daí fiquei sem vergonha.