Turi: Sapecando talento em BH
Há grandes cozinhas de alma tacanha e grandes cozinhas com ânimo oceânico. “O mar sem fim é português” e um gajo muito giro o estendeu até as nossas montanhas. Fomos conhecer o Turi, novo restaurante do chef Cristóvão Laruça localizado no Ponteio Lar Shopping. Tenho tanto a dizer sobre lá que tenho medo de tropeçar nas palavras e trôpega parecer ébria. Pausa, respira.
Turi é uma palavra em tupi que significa fogo, fogueira e a proposta da casa é justamente essa: a fonte de calor que prepara os alimentos é então somente o fogo, usando a lenha como combustível, num engenhoso sistema de fornos e grelhas que permite preparos e banhos de fumaça que se assemelham à boa feitiçaria.
O ambiente já é pura magia, elegante, de uma limpeza e potência estética que impressiona. A proposta é se utilizar de técnicas milenares de conservação e preparo dos alimentos como a fermentação e a defumação para ofertar (para a nossa alegria) um cadiquim de tudo: peixes, frutos do mar, carne de porco, wagyu. Legumes e verduras perfumados numa centelha mágica que traz um efeito “blush” a eles e a nós mesmos. Saúde e frescor são esbanjados por lá. Qualidade e controle de origem dos insumos, bem-estar e condições virtuosas de trabalho para a equipe. Mais e mais, sempre resulta em mais e no Turi, por minha conta, acresça um plus a mais.
Fomos de menu Confiança ( menu degustação R$180 por pessoa) que nos entrega, ao mesmo tempo, familiaridade e atrevimento.
Pães de fermentação natural, manteiga com algas fermentada na casa fazem o spoiler do que está por vir.
E vem um crudo de peixe no molho ponzo (me encanta o equilíbrio desse molho) physalis e raiz forte. Acidez e suavidade num contraste lindo. Depois vem um mexilhão que pelas barbas de Netuno, eu não estava preparada pra isso! Um mexilhão esculpido pelo bisturi de Pitangui, robusto e indecente. Diria sexy até, repousado num caldinho fermentado que essa tosca aqui, tratou de chuchar um pão e promover um match que o Tinder desconhece.
Respira fundo. Abre-alas pro tartar (impressionante) numa caminha de mil folhas de batata chuviscado por caviar de mujol. Daí entra o coração de pato amaciado numa marinada de vinho (vinho amolece os corações, por certo) e ricamente assistido de coulis de ameixa e beterrabas assadas finalizados na brasa. Quando já estava erguendo minha bandeira branca veio um peixe, um não; “O”. Engraçado que recentemente havia perambulado pelos restaurantes da cidade à procura de um bom peixe, sem muita sorte. Todos os maus-tratos que o cardume alheio encontrou nos preparos equivocados da vida, foram absolvidos ali.
O Turi é um lugar de indulgência pisciana que faz qualquer signo (até mesmos os coleguinhas satanÁRIES) sair do inferno astral. Um peixe preparado à perfeição, saracoteando entre legumes grelhados, tucupi negro e uma maionese de pil pil. O google veio ao meu socorro e esclareceu tratar-se de uma forma de preparo do bacalhau, no qual o azeite, num movimento giratório, se emulsiona com as proteínas do peixe. Nesse prato é servido em forma de maionese preparada a partir do colágeno do bacalhau. Se o Frajola experimentasse isso, além de ficar com a cútis em dia, talvez deixasse o doce passarinho em paz.
Ainda por aqui? Força guerreirex! Hoje era dia do caçador e a presa sucumbiu. Melhor dizendo, eu sucumbi a ela. A presa (lá servida é da raça duroc) é um corte da cabeça do lombo, sem capa de gordura e bastante marmoreada, dissolve na boca que nem os comprimidos de AAS infantil que a gente surrupiava aproveitando duma desatenção materna. Casada com pêssegos assados, cogumelos e endívias, a presa é uma dessas coisas que dificultam a vida daqueles que se propõem ao vegetarianismo.
Pedimos uma sobremesa só pra partilhar, por motivos de nível máximo de distensão dos músculos estomacais. Pavlova com frutas amarelas e creme de maracujá. Ufa!
A ideia é um menu sazonal, de acordo com o melhor que tá tendo em cada época. Mas confiança é coisa que não se quebra e o Turi me deixou em chamas tal qual Ciniiira de Tieta. Muita luxúria gastronômica pra uma criatura como eu, de carne fraca e cessionária de tentações. Meu caro chef Laruça foi modesto ao dizer que o Turi se resume ao fogo. Essa casa traz novos ares à nossa terra. Oceânica em possibilidades, todos os elementos se encontram ali. Orquestrado por um quinto: o respeito pelo sagrado da cozinha e das pessoas que dela vivem e se regozijam.
Que uma cascata de fogos de artifício com sabor de celebração seja lançada ao Turi! Parabéns!!!!