Belos nossos horizontes
BH é um ovo e é nessa proximidade e versatilidade que mora uma po-tên-ci-a, se soubermos tirar proveito dela. O bairrismo é uma bobagem que segrega e trabalha a favor da ignorância. Não olhar para o horizonte de possibilidades que nos abraça torna a vida imensamente tacanha! Um bom mineiro tem sempre um pé na cozinha (ou os 2) e uma curiosidade esgabilada. Não tem como negar, a cozinha é o principal lugar da casa. É lá que se preparam os afetos.
Sou uma pessoa que carrega o gene Michelin na veia (e o galo também, é claro). Opa! Aqui carece de boa uma explicação porque essa afirmação passa bem longe do quesito estrelas/estrelismo, uma associação mais rasa e vulgar do conceito. O guia nasceu, como devem saber, por iniciativa dos irmãos Michelin, donos de uma empresa de pneus que viram a necessidade de compartilhar com os viajantes: mapas, postos de combustível, lugares para comer e repousar em suas jornadas, e com isso, alavancar suas vendas.
O formato mudou muito e tornou-se ao longo do tempo o principal crivo de avaliação de restaurantes pelo mundo: (1 estrela quer dizer boa cozinha vale a visita, 2 estrelas, excelente cozinha vale o desvio, 3 estrelas, cozinha excepcional, vale a viagem). O que eu quero dizer quando afirmo ter o gene Michelin é que as minhas jornadas sempre são orientadas, mais do que qualquer outra coisa, pela oportunidade de conhecer os sabores do local. Sim, os meus roteiros de viagem sempre partem da premissa: o que é que comem por lá? Muito antes de saber às vezes, a própria localização geográfica do lugar. Tudo bem que o gene do GPS não veio incluído no meu código genético.
E aqui em BH eu não faço diferente. Fico absolutamente eufórica quando vejo gente desenvolvendo propostas instigantes, criativas e competentes pra vir somar ao quadro gastronômico cidade. E vasculho por todo canto, ainda que com a gasolina a 7 reais, atrás de promessas de uma bela luxúria gastronômica.
E pra farra ser completa, como gosto de escrever, coloco minhas duas taras misturadas em forma de croniquetas gastronômicas que publico, com a frequência que a minha indisciplina permite, desde 2013 no blog que mantenho com meu marido (amor da vida toda) o CASALCOZINHA.
O marido, Alexandre – que é a pessoa que cozinha de verdade no casal – eu faço mesmo é a Namaria Braga, gosto de pegar tudo mastigado e aparecer na hora da foto – compartilha lá no blog um tanto de receitas que testa ou inventa e engenhocas úteis e fúteis de cozinha (ah, se a minha dispensa falasse!).
Eu contribuo com a resenha do bar, do restaurante e de situações prosaicas que a boa (e a má mesa) nos oferecem de bandeja. Aliás, uma das coisas que eu mais gosto de fazer em restaurantes é observar e escutar (até onde a orelha consegue alcançar) as reações das mesas próximas diante dos pratos. Daria um reality de desbancar qualquer BBB. Abre teu olho, Netflix!
Além disso, acho uma das coisas mais gratificantes que existe no mundo, a sensação de indicar um restaurante e a pessoa dizer que adorou, que é a cara dela. É uma forma de realização torta da cozinheira que mora em mim, entende? Já que não posso te oferecer a iguaria em si, me realizo te ofertando a minha experiência, que vem sempre trabalhada na fantasia, nos murmúrios, neologismos e uma pancada de ironia (e dá ruim quando levada ao pé da letra, deixo aqui avisado).
Enfim, queria dizer o Óbvio. Existe comida boa e comida ruim e até mesmo nisso cabem boas discussões. O que, pra mim, é pecado que nem Deus perdoa; é comida desleixada, é não oferecer o que se tem de melhor, seja no prato ou no trato. E assim, elejo aqui dois pontos que acredito que BH deveria perseguir com muito afinco na sua trajetória de cidade criativa da gastronomia:
1) REGULARIDADE: perseguir uma “padronização” dos processos e assegurar a qualidade dos insumos. Por mais que eu deteste a palavra “padronização”, é fundamental entregar sempre a mesma coisa pra garantir que o comensal não tenha que “dar sorte” no dia em que vai a um determinado restaurante. Vai que é o sujeito é um Mick Jagger da vida, né? E isso não quer dizer limitar a criatividade, tá ok? Mas, pra mim, decidiu colocar no cardápio? Tem que ter um molde e excelência diária e estreita na execução. Quem disse que a vida de cozinheiro seria simples enganou o bobo na casca do ovo. “O QUERERES” culinário é feito de métrica, rima e MUITA dor.
2) CORTESIA E TREINAMENTO: Escolha o seu estilo de atender, sua vibe, sua própria pompa e circunstância; mas trabalhe com a equipe afinada e informada. Deixar todo mundo muito bem inteirada daquilo que se oferece pro cliente é o embrião de uma boa experiência pra mim (me contaram amigos “véios de praça” que tem dono de restaurante que não deixa os garçons experimentarem a comida da casa) …. mistério sempre há de pintar por aí.
A saideira e um P.S.! Porque eu perco o leitor, (ou o ouvinte) mas não abro mão de um P.S. crocante!
Outro dia alguém comentou numa resenha de restaurante que eu escrevi:
“acho muito engraçado quando pobre come em restaurante de rico kkk”
Eu mentalmente respondi já que não consegui desler aquilo: quando a alma é pequena é foda, né Pessoa? Mas o que fazer quando o paladar também é?
Em BH, o nosso paladar é gigante e o apetite maior ainda. Bora traçar o mundo que nós queremos a visita o desvio e a viagem!
OBRIGADA!!!!